24 agosto, 2015

Fernanda Meybom: Coluna 12 - La Soup Populaire: O requinte cultural e gastronômico no coração de Berlim


Portões de ferro enferrujados. No pátio, uma carcaça de um ônibus queimado. Ao fundo, uma edificação antiga com ares de construção industrial, paredes feitas com tijolos à vista nitidamente castigadas pela ação do tempo. Aparentemente deserto, porém com ambiente limpo e organizado. Ao abrir a antiga e pesada porta de metal, o grande ar de mistério que paira sobre este lugar faz com que tenhamos a sensação de que estamos entrando numa parte da história de Berlim. Estou em busca do La Soup Populaire, restaurante do Chef Tim Raue, duas estrelas Michelin.
 

Por volta de 1886 o local abrigava a maior cervejaria do norte da Alemanha, a Bötzow Brauerei. Havia ali também um famoso e bem frequentado Biergarten (ou bar/restaurante da cervejaria) com espaço para 6 mil pessoas, do qual Julius Bötzow, proprietário da cervejaria, orgulhava-se em ter entre seus costumeiros frequentadores a realeza alemã. Bötzow recebeu inclusive uma certificação da corte real pela excelente qualidade da sua cerveja.
A cervejaria viveu seus anos de glória até a Primeira Guerra Mundial, fase economicamente difícil mas sem interrupção de sua produção. O mesmo não ocorreu durante a Segunda Guerra Mundial quando algumas partes da cervejaria foram destruídas, mesmo assim continuou produzindo até 1949. Desde então, o prédio abrigou mercados populares e logo após a queda do Muro de Berlim, em 1989, hospedou a primeira loja de produtos da Alemanha Ocidental. A partir de 2001 o local se tornou espaço cultural, com festas de música eletrônica, exposições de arte e cinema.
 

Neste contexto surgiu o La Soup Populaire, em 2013, com o conceito de combinar arte contemporânea com a mais fina arte culinária, sendo definido por especialistas internacionais como “Berlin’s most exciting food projects: fantastic architeture, world class art and best fine dinning restaurant” e um dos favoritos do Presidente Barack Obama em suas visitas a capital germânica.


O restaurante fica no Studio House da cervejaria, a única parte que foi completamente renovada. Para encontrá-lo, ao passar pela porta da antiga cervejaria, seguimos pelos seus históricos e bem preservados corredores e chegamos a um espaço com 10 metros de pé direito, que hospeda uma galeria de exposições de arte e um mezanino onde estão localizadas as mesas do restaurante com uma visão privilegiada de toda a galeria.
 

É impressionante como o elegante restaurante entra em simbiose com o ambiente industrial. Mobiliário vintage, configurações de mesa minimalista e iluminação quente que direciona o foco para as obras de artes expostas e, claro, para o que está sendo servido.
O menu, que vem num formato de livro antigo com uma linda capa de couro, faz parte deste conceito pois algumas das criações do estrelado Chef são inspiradas nas obras em exposição. Além do temporário, há ainda o menu padrão que valoriza pratos clássicos de Berlim, como a moderna versão do Königsberger Klopse: almôndegas com farofa de castanhas, purê de batatas com molho de queijo e lascas de beterraba.
Cada curso é servido em pratos de porcelana branca com design dos anos 30, produzidos pela Royal Porcelain Factory (KPM) da capital alemã. Cada detalhe, minimamente pensado, tem como objetivo valorizar a filosofia de Tim Raue a “people’s cuisine” que prioriza pratos descomplicados feitos com os melhores e mais frescos ingredientes.


O destaque das bebidas são os vinhos. Mesmo assim, há poucas porém boas opções de cervejas como: a tradicional Paulaner Weizen; duas opções da BRLO Craft Beer que representa a nova geração de cervejas alemãs: uma de estilo Hell e outra Pale Ale; além da Rothaus Tannenzäpfle Pils e de uma cerveja sem álcool, a König Pilsener Alkoholfrei.

Nossas escolhas no menu:

Couvert:
Pães, linguiças alemãs e conservas. Tudo preparado no próprio restaurante.

Entrada:
Gilthead – melon/coriander: Incrível a combinação de sabores deste prato, o filé de peixe com o doce do melão rosado e da lasca de coco, combinados com o tempero das folhas frescas do coentro. Inesperadamente Fantástico!
Harmonização:
Vinho Riesling Lotusblüte – Dreissigacker Rheinhessen.
Cerveja BRLO Craft Beer Pale Ale.

Pratos Principais:
- Königsberger Klopse: Um dos principais pratos da casa, este clássico de Berlim é muito bem executado, incrível textura da carne com castanhas e o delicioso purê de batatas. A beterraba equilibra com um sabor doce e picante ao mesmo tempo.
Harmonização:
Vinho Nelumbo – Markus Schneider.
Cerveja BRLO Craft Beer Pale Ale.

- Meat Loaf: filé ao molho de cogumelos com ervilhas e lascas de cenoura. Fantástico equilíbrio de sabores onde o destaque fica pelos cogumelos frescos e a carne no ponto certo. As ervilhas e a cenoura dão suavidade ao prato.
Harmonização:
Vinho Black Print - Markus Schneider.
Cerveja BRLO Craft Beer Pale Ale.

- Codfish - tarragon and cucumber. Incrível sabor do bacalhau fresco sendo o creme de pepino um belo coadjuvante. Fantástico!
Harmonização:
Vinho Riesling Lotusblüte – Dreissigacker Rheinhessen.
Cerveja BRLO Craft Beer Hell.

Sobremesas:
- Bee sting cake – apricot: Uma deliciosa calda de damasco com mini bolo, combinado com mini suspiros e a inesperada e deliciosa combinação de folhinhas frescas de manjericão. Impossível descrever o sabor delicioso desta sobremesa.
Harmonização Riesling Sekt – Dreissigacker Rheinhessen.

- Fürst pückler – strawberry and chocolate: Mini bolos com sorvete, trufas de chocolate e lascas de morango. Clássico e delicioso!
Harmonização Riesling Sekt – Dreissigacker Rheinhessen.

Junto à conta recebemos saborosas trufas de chocolate, fechando de maneira delicada e gentil uma magnífica refeição e um serviço impecável.
Com certeza, uma das melhores experiências gastronômicas da minha vida, fazendo com que Berlim esteja sempre em meu roteiro europeu de viagens.


Sobre as obras de arte e a inspiração do cardápio:
Bisky at Bötzow: Entitulado “Balagan”, Norbert Bisky mostra seu novo trabalho no Studio Bötzow. As obras foram elaboradas nos últimos meses em Tel Aviv e exclusivamente para esta exposição. Caos, transtorno, confusão, mas também festa, alegria e vivacidade: este é o significado de “Balagan” uma palavra de origem Persa.

Nota: As reservas precisam ser feitas com antecedência de 2 meses, dependendo da época do ano.

Serviço:
La Soup Populaire
Atelierhaus – Prenzlauer Allee, 242.
10405 Berlin
http://lasoupepopulaire.de/en/
*artigo originalmente publicado na Revista Spazio.

Leia as outras colunas da Fernanda Meybom.
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