19 dezembro, 2016

Tendências mundiais sobre diferentes ingredientes na cerveja, por Jerome Pellaud


Jerome Pellaud, vice-presidente global de Craft & Specialties da AB Inbev, elaborou um conteúdo especial sobre tendências mundiais do uso de diferentes ingredientes na cerveja, bem detalhado, cheio de referências históricas e geográficas.

Grande especialista em tendências no universo cervejeiro, aqui ele conta como a diversidade de ingredientes usados para a produção da bebida – sejam especiarias, frutas, grãos, café e até abóbora – criam novos tipos e estilos de cerveja, que agradam os mais variados paladares pelo mundo.

 “De todas as bebidas alcoólicas, a única categoria que permite aos seus fabricantes expressar a maior criatividade é, sem dúvida, a cerveja”, afirma Jerome.
                                                                                                                                                                             
Liberdade de escolha
A cerveja não só pode utilizar muitos tipos diferentes de malte de cevada e de trigo (variando de malte pálido a escuro, caramelo, chocolate, torrado, defumado etc), como também, na grande maioria dos países, incluir outros cereais e grãos como quinoa, sorgo, centeio, aveia, milho, arroz, trigo mourisco e milheto. Muitos ingredientes naturais podem ser usados ​​pelos mestres cervejeiros para criar estilos únicos e deliciosos.

Os cervejeiros belgas estão entre os primeiros a explorar a diversidade de ingredientes na bebida. O estilo de cerveja mais famoso usando ingredientes criativos para entregar um perfil de sabor único e altamente aclamado é a cerveja de trigo de origem belga. No entanto, os cervejeiros artesanais dos EUA abraçaram a fabricação de cerveja com ingredientes incomuns para aprofundar os limites dos estilos e criar cervejas novas, singulares, gostosas e populares.
Vários estilos de cerveja muito tradicionais e famosos usam ingredientes além da visão muito estreita da lei de pureza alemã, de 1516. Essa lei foi, antes de tudo, uma maneira de aumentar os impostos sobre a produção de cerveja por meio de um rigoroso controle dos ingredientes.

Especiarias
Os cervejeiros belgas foram os primeiros a ultrapassar os limites da cerveja. Mesmo antes da Bélgica se tornar um país independente, eles exploraram o uso de especiarias e frutas. Localizados nos cruzamentos entre Reino Unido, França e Holanda, tiveram a sorte de poder usar não só os ingredientes produzidos localmente, mas também brincar com especiarias disponíveis pelos comerciantes na região. As cervejas de trigo belga são fabricadas com sementes de coentro, casca de laranja amarga, bem como trigo não amadurecido, além do malte de cevada mais tradicional e lúpulo. Isso dá uma ligeira refrescância cítrica e notas florais à cerveja. É muito apreciada no mundo todo e inspirou gerações de cervejeiros em muitos países.

Um estilo belga que vive um boom atualmente é o Belgian Saison, elogiado por seu perfil de sabor complexo, porém refrescante e leve. As Belgian Saison foram originalmente fabricadas no outono, fermentadas lentamente durante os meses mais frios para serem servidas aos trabalhadores durante a temporada de colheita de verão (saison em francês). Produzida às vezes com algum trigo e/ou aveia, os cervejeiros adicionam frequentemente pimenta malagueta para dar uma nota apimentada leve, acentuada pelo uso de variedades tradicionais do lúpulo.

Os cervejeiros alemães testam há muito tempo os limites da lei da pureza, muito restritivos para muitos deles. No norte da Alemanha, em torno da cidade de Leipzig, há quase 1.000 anos cervejeiros têm fabricado uma Ale azeda e salgada, feita principalmente a partir de malte de trigo e usando sementes de coentro. Este estilo de cerveja único é conhecido como Gose, em homenagem ao rio Gose que flui na cidade de Goslar, cerca de 150 km a oeste de Leipzig. Gose tem sido tradicionalmente fabricado utilizando água ligeiramente salgada, que era a água natural proveniente dos aquíferos ricos em minerais em Goslar e seus arredores.

Moderadamente azedo, frutado, com um acabamento salgado marcante, o Gose foi redescoberto recentemente e muitas variadades foram lançadas, especialmente no verão norte-americano.

O que é mais tradicional à primeira vista do que as famosas Belgian Trappist, fabricadas exclusivamente por monges em mosteiros? A maioria de suas cervejas alcançaram o status de “cult” com consumidores que cruzam grandes distâncias para colocar as mãos em suas garrafas. A maioria usa açúcar mascavo e especiarias como noz moscada e/ou coentro. Algumas usam a pimenta malagueta. Mas todos tratam sua a receita como um segredo cuidadosamente guardado.

Frutas
Há mais de dois séculos, elas aperfeiçoaram a arte da fermentação espontânea, criando os famosos estilos de cerveja azeda como Gueuze, Lambic e Kriek. A Kriek é feita com cerejas ácidas infundidas durante vários meses em barris de madeira. A cerveja resultante é uma bomba de fruta, com forte nota de cereja, acento doce e azedo e uma bela cor vermelha. Dado o sucesso de Kriek, cervejeiros da Bélgica e de outros países têm, desde então, feito experiências com muitas outras frutas, principalmente mirtilos, amoras, morangos e pêssegos.

Um dos mais recentes e interessantes desenvolvimentos em termos de inovação na fabricação de cerveja vem da Itália. Os italianos têm trazido para o mundo tantas iguarias  e bebidas alcoólicas, que não é surpresa que os cervejeiros italianos queiram criar os  seus próprios estilos de cerveja. Como resultado, eles experimentaram com sucesso a mistura de uva e cereais para criar novos estilos de cerveja incríveis e delicados, que ficam entre o vinho espumante e a cerveja.
 

As tendências que crescem mais rapidamente nos EUA nos últimos dois anos são as de cervejas com frutas, com destaque para as IPAs cítricas. Estas cervejas deliciosas são fabricadas com frutas cítricas inteiras, sucos ou cascas, para aumentar as notas cítricas do lúpulo que as pessoas gostam tanto em IPAs. Uma evolução ligeiramente mais recente desta tendência é a ampliação da nota tropical proveniente de novas variedades de lúpulo pela adição de manga, maracujá e/ou abacaxi durante o processo de infusão.

Grãos
Por séculos, os grãos têm representado uma fonte natural de açúcar para a nutrição e criação de bebidas alcoólicas famosas. As pessoas têm usado o grão mais fácil de crescer e, portanto, mais amplamente disponível em torno deles. Se a civilização e a fabricação de cerveja tivessem começado na China, por exemplo, todas as cervejas modernas seriam provavelmente compostas por arroz, mas ele é um cereal difícil de cultivar.  No “Novo Mundo”, a fabricação de cerveja foi baseada em outra cultura nativa fantástica, o milho. A cerveja resultante foi chamada localmente de “chicha”.

A Oatmeal Stout são famosas pelo uso de aveia. Ela traz um acabamento agradável, aveludado,  tostada e toffee.

Outro antigo estilo de cerveja que usa grãos diferentes é o Sathi, da Finlândia. É fabricado com grãos maltados e não maltados, incluindo cevada, centeio, trigo e aveia. Sathi é uma cerveja tradicionalmente aromatizada usando bagas de zimbro.

O centeio está ganhando popularidade na fabricação de cerveja, especialmente no estilo Pale Ale. Ele traz um tempero único e uma amargura muito leve, complementando a espinha dorsal de lúpulo e malte.

Outros ingredientes


Café: Com 168 inscrições no Great American Beer Festival, as cervejas de café representam uma das categorias que crescem mais rapidamente.
Chocolate: nos últimos anos, os fabricantes de cervejas artesanais têm lançado versões deliciosas de Porter e Stout com este ingrediente. Muitas vezes também combinadas com pimenta, como uma variante da tradicional mexicana Molle.
Raízes de genciana: as raízes amargas são usadas tradicionalmente em licor na Suíça e na Itália. Elas podem substituir parte do lúpulo e trazer um acabamento ligeiramente terroso e de ervas amargas para a cerveja. Exemplo: Birra Del Borgo Genzianna.
Abóbora: A cerveja de abóbora é popular desde o século XVII nos EUA, com um pico no século XVIII. O estilo tornou-se favorito no outono. É muitas vezes fabricado com canela, gengibre, noz-moscada e/ou toda a especiaria que crie um sabor de “aquecimento”.
Mel: tem sido usado na cerveja para trazer uma complexidade doce e agradável, além de ser um ingrediente local muito natural.
Flores: o jasmim é usado em cervejas icônicas como Elysian Jasmine Avatar IPA.
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